quarta-feira, 14 de fevereiro de 2024

São Cirilo e São Metódio


    Ativos missionários, verdadeiros modelos para toda a Igreja, com justiça esses irmãos foram carinhosamente denominados de 'Apóstolos dos Eslavos', e São João Paulo II declarou-os co-Padroeiros da Europa, junto a São Bento, Santa Brígida da Suécia, Santa Catarina de Sena, e Santa Benedita da Cruz.
    Nascidos em Tessalônica, nesses tempos terras da Macedônia grega, São Metódio entre 815 e 820, e São Cirilo, o caçula de sete, entre 827 e 828, eram filhos de Leo, um alto militar grego do Império Romano do Oriente, ou Bizantino, e de mãe eslava, Maria, com quem teriam aprendido o dialeto eslavo-macedônico. Seus nomes de nascimento eram Miguel e Constantino, respectivamente. Perderam o pai quando São Cirilo tinha apenas 14 anos, e foram entregues a um ministro-chefe imperial, Theoktistos, eunuco e sábio educador, fundador da Universidade de Magnaura, na cidade de Constantinopla, antiga Bizâncio e atual Istambul, onde São Cirilo viria a ser professor.
    Por sua brilhante inteligência, São Cirilo foi ordenado padre antes mesmo de terminar seus estudos, enquanto São Metódio, apesar de ordenar-se diácono, escolheu trabalhar como alto oficial do governo, e mesmo após muitas frustrações nesse cargo e longos períodos em missões religiosas, só em 868 deixou-se ordenar padre.
    Mestre em Teologia, além de dominar os idiomas árabe e hebreu, São Cirilo foi enviado para debater a Doutrina da Santíssima Trindade com teólogos árabes no Califado de Samarra, cidade do atual Iraque, com o objetivo de melhorar as relações com este governo durante a expansão, quase sempre pela violência, do islamismo.
    A segunda missão foi entre os anos 855 e 861 no Império Cazar, que durou de 650 a 1048 e hoje corresponderia a porções da Bielorrússia, Rússia, Crimeia, Geórgia, Azerbaidjão e Cazaquistão. Era um pedido de Miguel III, imperador bizantino, e de Fócio, patriarca de Constantinopla, que foi seu professor na universidade e grande inspirador nos primeiros anos. O objetivo confiado a São Cirilo era impedir uma onda de reconversão ao judaísmo nessa região, causada pela polarização entre o Catolicismo e o islamismo. Por esse período e por suas mãos, deram-se os batismos de Ascold e Dyr, príncipes do Rus' de Kiev, estado predecessor das atuais nações da Ucrânia, Bielorrússia e Rússia.
    Apesar de não ter sido bem sucedido, São Cirilo aprendeu a língua cazar enquanto esteve na cidade de Quersoneso, uma antiga colônia grega na península de Taurica, atual Crimeia. Através dos encontros que manteve com cristãos que estavam nessas terras desde os tempos dos Apóstolos, conheceu os eslavos das tribos Rus, súditos dos Cosaros, e com um sábio local estudou a língua, a escrita e os sagrados livros que guardavam.
    Tinha várias semelhanças como a língua macedônica, mas era muito complicada de ler e escrever. São Cirilo então resolveu reaproximar esta escrita às letras gregas, latinas e hebraicas, destas usou muitos caracteres de fonemas que já existiam na antiga língua eslava-russa, e para os que faltavam adotou antigos caracteres ou inventou novos. Assim criou o Alfabeto Glagólico ou Glagolítico, mais tarde chamado de Cirílico, em sua homenagem, que era a primeira língua literária eslava e tornar-se-ia a oficial do Império Búlgaro, vigente entre 632 e 1018.
    Integralmente ou com ligeiras variações, estes caracteres hoje são usados nas seguintes línguas eslavas: bielorussa, macedônica, russa, sérvia, ucraniana, azerbaidjana, cabardina, casaquistana, iacuta, moldaviana, nenena, ossetina (osseta), quirguiza, tchuvashes, turcmena, udmurtana e uzbeca, além do mongol, do uzbeque e do tadjique, entre outras da Europa Oriental, do Cáucaso e da Sibéria.

 
    Retornando a Constantinopla, São Cirilo tornou-se professor de filosofia na Universidade de Magnaura, enquanto São Metódio ocupava cargos cada vez mais importantes na política e administração bizantina, e era abade do monastério de Bósforo, no lugarejo de Crisópolis, que atualmente é distrito de Istambul.
    Por conta do importante trabalho de São Cirilo no Império Cazar, os irmãos foram convidados pelo príncipe Ratislav, da Grande Morávia, reino eslavo que se estabeleceu de 833 até 894 em terras do centro-leste europeu, atualmente parte ou totalidade de países como Alemanha, Polônia, Áustria, Hungria, República Checa, Eslováquia, Romênia, Eslovênia, Sérvia, Croácia e Ucrânia. Ele queria que nosso Santo, ajudado pelo irmão 'burocrata', fizesse missões em suas dominações, que foram empreendidas entre 863 e 867, para reforçar a identidade de seu povo pelo culto ao próprio idioma. O objetivo do príncipe era afastar as invasões e influências alemãs em suas terras, em parte realizadas através de missionários germânicos, que em suas catequeses tentavam impor-lhes o latim ou, em último caso, o grego.
    Lá chegando, eles começaram a traduzir a Liturgia para a escrita eslava, que São Cirilo havia criado, e por isso também ficou conhecida como 'Eslavo da Igreja Antiga', ainda hoje usado na Liturgia de muitas igrejas ortodoxas e igrejas católicas do leste. O clero germânico fez-lhe forte oposição, mas não foi o bastante para aplacar o sucesso que tiveram junto ao povo. Ainda a pedido do príncipe, eles redigiram o primeiro Código Civil Eslavo e foram os fundadores da Academia da Grande Morávia, onde prepararam uma geração de religiosos, incluindo o próprio São Metódio.
    Por fim, puseram-se a traduzir a própria Bíblia, iniciando pelos Evangelhos e Salmos, e seguindo pelos mais importantes livros do Novo e do Velho Testamento, embora os registros apenas mencionem os 'Evangelhos de São Cirilo', ou do 'Evangelho Eslavo'. Tal empresa logo chegou ao conhecimento do Papa Nicolau I, que, entusiasmado com a grande e rápida difusão do Evangelho, em 867 convidou-os a Roma. Foi nessa ocasião que, viajando em companhia de um séquito de religiosos, da Crimeia a Roma trouxeram as relíquias de São Clemente.
    Sofriam, contudo, muitas e duras críticas de Teotmar, Arcebispo de Salzburgo e Bispo de Passau, hoje terras da Áustria e Alemanha, respectivamente, que reclamava o território no qual nossos Santos evangelizavam e não aceitava a Liturgia em outra língua que não o latim. Entretanto, com a morte de Nicolau I e antes da chegada deles a Roma, dada em 868, o Papa Adriano II calorosamente recebeu-os, reconheceu a luminosa Sabedoria de São Cirilo e concedeu formal autorização para o uso da Liturgia Eslava, assim como para as traduções dos sagrados livros. Foi nessa ocasião que São Metódio se viu compelido a ordenar-se Sacerdote.


    Seu mais novo irmão, porém, sentindo aproximar-se sua hora e cansado de tantos conflitos, tornou-se monge, como era seu desejo havia algum tempo, abandonou o nome de Constantino para adotar o de Cirilo, e veio a falecer 50 dias depois, no dia 14 de fevereiro de 869. À época, suas relíquias foram enterradas no subsolo da secular Basílica de São Clemente, próxima ao Coliseu, cuja estrutura de igreja remonta o período ainda clandestino do Catolicismo em Roma, no século I, e é riquíssima em construções arqueológicas, pois anteriormente aí se celebravam cultos pagãos.


    No ano seguinte, São Metódio foi ordenado Arcebispo da Panônia e da Morávia, mas, por problemas políticos com a destituição de Ratislav, decidiu-se ficar na Panônia, região que hoje corresponde a terras da Hungria, Croácia, Eslovênia, Bósnia e Herzegóvina e Sérvia, onde tinha o apoio do príncipe Kocel, que era eslavo e admirador seu trabalho. No entanto, aí nosso Santo também sofreu novas investidas dos episcopados germânicos, principalmente do Arcebispo de Salzburgo, a quem a Panônia havia pertencido como jurisdição.
    No sínodo de Regensburg, cidade da Bavária, atual Alemanha, São Metódio foi considerado invasor pelos clérigos germânicos e levado para a cidade de Ellwangen, no mesmo país, onde ficou encarcerado por dois anos e meio. Apesar da insistência do Arcebispo de Salzburgo, o Papa João VIII tomou o lado de São Metódio, e, trazendo todos a Roma, reinstituiu-lhe o arcebispado e pediu a punição de seus adversários.
    Com a expulsão dos religiosos germânicos da Grande Morávia, que aconteceu logo em seguida, São Metódio, já vivendo autêntica santidade, teve muito frutífero período. Traduziu quase todos livros que restavam da Bíblia, além das valiosíssimas obras dos Padres da Igreja, e com maestria difundiu o salvífico amor até sua morte, em 885, deixando junto ao trabalho de seu irmão uma marcante influência no desenvolvimento cultural dos povos eslavos, realmente um brilhante feito de prático cunho, de notória inspiração.
    Três séculos mais tarde, a cidade de Velehrad, na atual República Checa, construiria uma monumental basílica em homenagem a Assunção de Nossa Senhora, que mais tarde veneraria também a ele e seu irmão.


    Após sua morte nesta cidade, e a do Papa Adriano II também em 885, os discípulos dele e de São Cirilo foram expulsos da Morávia por reviravoltas políticas. O resultado, porém, foi exatamente o inverso: eles espalharam-se por todas terras eslavas, principalmente na atual Bulgária, pregando o Santo Evangelho na língua eslava, fundando escolas de Teologia e praticando o Rito Eslavo com estrondoso sucesso.


    Nossos Santos também são muito venerados pela Igreja Ortodoxa Russa, com o título de "Iguais aos Apóstolos", e anualmente realizam-se grandes procissões e festas por todo o país neste dia, que o diabólico comunismo tenta renomear como 'Dia da Literatura e Cultura Eslava'.


    Recentemente reencontradas, após preventivo resgate contra as danosas repercussões da ira anticlerical levada a cabo pela bestial Revolução Francesa, as relíquias de São Cirilo novamente foram guardadas Basílica de São Clemente, onde a ele e a seu irmão é dedicada uma capela.
   

    São Cirilo e São Metódio, rogai por nós!