domingo, 14 de maio de 2023

São Matias Apóstolo


    Dentre os Apóstolos de Jesus, é de quem temos menos registros, o que não significa que teve menos ativo ministério. Pelo contrário, há várias indicações de sua presença em muitos lugares e seu martírio é testemunhado pela Sagrada Tradição, embora não se sabia exatamente onde ou como tenha acontecido. Ou seja, tanto suas muitas viagens como sua morte atestam intensa atividade e efetivo anúncio do Evangelho, ou não teria sido reconhecido como um líder cristão e por isso assassinado.
    Seu nome aparece no livro dos Atos dos Apóstolos logo após o discurso de São Pedro, defendendo que alguém deveria ser indicado para ocupar o lugar de Judas, que traiu Jesus e acabou cometendo suicídio. Para tanto, o Príncipe dos Apóstolos fundamentou sua argumentação usando passagens do Antigo Testamento: "Por que está escrito no livro dos Salmos: 'Fique deserta sua habitação, e não haja quem nela habite'; e: 'Que outro receba seu cargo' (Sl 68,26; 108,8)." At 1,20
    Ainda segundo São Pedro, o critério a ser usado para recompor o Colégio dos Doze deveria basear-se em específicas qualidades. Nos primeiríssimos anos da Igreja, com efeito, o anúncio dos Apóstolos essencialmente constituía-se em testemunhar a Ressurreição de Jesus. Suas aparições eram a definitiva prova de que Ele realmente era o Cristo, Revelação que eles sempre proclamavam fazendo referência às profecias do Antigo Testamento. Depois também passaram a narrar os detalhes de Sua Paixão, e só pouco mais tarde Seus ensinamentos. Nesse sentido, as narrativas de toda Sua história, incluindo genealogia, Nascimento e infância, só tornaram-se praxe passadas quase duas décadas, quando se fez necessário pôr por escrito os Evangelhos.
    São Pedro, portanto, queria uma testemunha ocular, como eram os Onze, para o lugar de Judas. Principalmente da Ressurreição, como vimos, mas também de toda vida pública de Jesus. O que não era difícil de achar por aqueles tempos, porque muita gente O havia seguido, embora naquela reunião em Jerusalém estivessem apenas cento e vinte pessoas. É o que São Pedro vai determinar: "Convém que destes homens que têm estado em nossa companhia todo tempo em que o Senhor Jesus viveu entre nós, a começar do Batismo de João até o dia em que de nosso meio foi arrebatado, um deles torne-se conosco testemunha de Sua Ressurreição." At 1,21-22
    É nessa circunstância que aparece o nome de São Matias: "Propuseram dois: José, chamado Barsabás, que tinha por sobrenome Justo, e Matias." At 1,23
    E logo em seguida, após a oração, "Deitaram sorte e caiu em Matias, que foi incorporado aos Onze Apóstolos." At 1,26
    Isso teria acontecido depois da Ascensão do Senhor e antes do Pentecostes, ou seja, São Matias estava presente no dia do Nascimento da Igreja, quando sobre ela foi derramado o Espírito Santo. E como ele acompanhou Jesus desde Seu Batismo, certamente estaria entre os 72 discípulos por Ele enviados às aldeias e cidades para evangelizar, conforme o registro de São Lucas: "Depois disso, designou o Senhor ainda setenta e dois outros discípulos e mandou-os, dois a dois, adiante de Si, por todas cidades e lugares aonde Ele tinha que ir." Lc 10,1
    Apesar de possuir o título de Apóstolo, ele também é tido como o Primeiro Bispo da Igreja, pelo fato de ter sido o primeiro constituído pelos Apóstolos para suceder um deles. De fato, o título de Apóstolo coube apenas aos pessoalmente chamados por Jesus, como era seu caso pois estava entre os 72, e este epíteto, que significa 'enviado', foi exclusivamente conferido pelo próprio Mestre: "Naqueles dias, Jesus retirou-Se a uma montanha para rezar, e aí passou toda noite orando a Deus. Ao amanhecer, chamou Seus discípulos e escolheu Doze dentre eles, que chamou de Apóstolos." Lc 6,12-13
    São Paulo, um deles, pois também foi pessoalmente enviado por Jesus, apesar de em início ter considerado São Barnabé um Apóstolo, no que influenciou São Lucas, corrige-se e vai restringir o uso desse título: "São todos Apóstolos?" 1 Cor 12,29a
    A São Matias, pois, é atribuído a introdução do cristianismo no Egito, que mais tarde, mesmo com a memorável evangelização de São Marcos, seria desvirtuado pela corrente 'gnóstica' de misticismo e tornar-se-ia um evangelho apócrifo. Por suas estreitas relações com São Filipe e São Tomé, há indícios de sua presença na Etiópia, onde teria sido crucificado, embora os cristãos coptas, baseados em escritos atribuídos a São Filipe, apontem-no evangelizando em terras bem distantes daí, no norte da África.
    Sua presença também é plausivelmente indicada na Macedônia, onde teria chegado junto a quatro Apóstolos. Ainda levantou-se a possibilidade de que ele, e não São Mateus, tenha morrido na Pérsia sob perseguição dos judeus, mas deve-se lembrar que, pela semelhança dos nomes, frequentemente eles eram confundidos. Igualmente há relatos de suas pregações na Capadócia, atual Turquia, e no litoral do Mar Cáspio, ainda mais a leste, em terras hoje do Irã ou do Azerbaidjão.
    A terceira e mais provável hipótese de seu martírio aponta para a região da Cólquida, atual Geórgia, no Cáucaso, onde teria sido crucificado. Aí têm-se, na fortaleza romana de Gonio-Apsaros, em Adjara, costa do Mar Negro, uma pequena capela dedicada a ele e um marco histórico indicando sua sepultura.


    Todavia relata-se sua presença e atividade na Judeia, onde se aventa ter sido apedrejado e decapitado por um golpe de machado. Aqui, mais um vez, a autoria do assassinato é atribuída aos judeus, pois no início os Apóstolos intensamente trabalharam visando reformar o judaísmo.
    Tal versão explicaria o traslado de suas relíquias da Judeia para Itália, realizado no século IV por Santa Helena, mãe do Imperador Constantino. Uma antiga tradição diz que parte delas teria ficado em Roma, sob o altar da Basílica de Santa Maria Maior.


    Por remontar tantos séculos, e desde então não mais haver registros dessa parte guardada em Roma, presume-se como igualmente certa a medieval tradição que localiza a maior parte suas relíquias na Basílica de Santa Justina, em Pádua, também na Itália, onde já estavam os restos mortais de São Lucas. De fato, aí há uma bela urna em mármore dedicada a São Matias.


    Ainda no século IV, a outra parte teria sido levada para Trier, na atual Alemanha, onde em 1127 foi reencontrada durante a reconstrução de uma antiga igreja do século X, erguida em sua homenagem. Essas relíquias são veneradas numa belíssima cripta.


    São Matias, rogai por nós!